EM 1956 nasceu um indivíduo, na zona sul da província de Tete, mais concretamente na área entre os rios Zambeze e Chire ( Inhangoma). Em plena era colonial, conheceu todas as amarguras da vida daquela época, a falta de roupa, alimentação adequada, assistência médica e medicamentosa, toda uma série de necessidades básicas para uma vida humana e digna. Para não deixar de salientar o fenómeno de segregação racial, que se vivia por todo o país(Moçambique). Aos sete anos ingressou numa escola primária missionária.
Na condição de indígena não assimilado, a única via, era apenas estudar nesse tipo de ensino. Foi uma vida difícil,tinha que percorrer diariamente vinte e cinco quilómetros para escola. Na mesma sala de aulas compartilhavam duas classes e com o único professor.
As actividades domésticas, essas não faltavam, pastar cabritos,caçar gazelas e animais de pequeno porte, pescas etc. Tudo isso, era tido como o quotidiano de um jovem normal e obediente e granjeava prestígio no seio de populares.É o que interessava à juventude da época...
Em 1968, após uma longa batalha de vaivém consegue concluir o ensino primário, numa situação muito difícil. Se bem que todos os alunos missionários, eram obrigados a prestarem exames da quarta classe, numa escola oficial (do governo), com nota zero,conhecer bem a geografia , história de Portugal e o hino nacional de Portugal. Portanto, o aluno tinha como obrigação, no ensino primário conhecer teoricamente Portugal e a história dos portugueses. Os exames sempre eram duros para os alunos das missões, especialmente nas provas orais.
Com a quarta classe feita, julga-se meio caminho andado. Era necessário procurar Vilas da época, para um possível emprego. Foi assim que em 1970 descobre uma vila açucareira na província de Sofala (Marromeu). Valeu a pena conhecer este povo hospitaleiro, meigo e amável. Praticamente foram dois anos convivendo com esse povo, em plena época colonial.
O desejo ardente era uma possível progressão na esfera social (desafio de todo mundo), para tal , se chega na cidade da Beira em piores condições. Ora bem, isso acontece como havia dito em plena época colonial, as coisas não eram tão fáceis como se esperava de uma cidade como Beira, dominada economicamente pela classe de elite colonial. Opção inicial para sobreviver:( se transforma num serviçal, em quase dois anos neste tipo de actividade de sobrevivência, sujeitando à uma série de vicissitudes da época).
Mas valeu a pena, e as portas iam-se abrindo. Primeiro pela intensificação da luta pela libertação de Moçambique, liderada obviamente pela FRELIMO. A consciência patriótica se apodera a toda gente oprimida, a esperança pelas mudanças e a independência nacional, era a conversa de cada esquina entre os oprimidos.
Finalmente os acordos pela paz foram alcançados, e abriram-se os novos horizontes, alfabetização, educação de adultos e o conceito de produção e produtividade se vigora. O novo rumo dependia dos esforços de cada um dos moçambicanos.
Finalmente, se consegue concluir o nível básico com sucessos, e pode-se ingressar numa grande empresa, então estatal, Caminhos de Ferro de Moçambique como funcionário de estado, estamos a referir os meados de 1977, durante dois anos de intensos trabalhos, em 1979 é transferido para da antiga TRANZ-ZAMBEZIA-RAILWAYS (TZR), linha de Sena, mais concretamente na Estação de Dona Ana em Mutarara, por sinal sua terra natal.
Os imperativos da nação,em 1975, aos 25 de Junho o povo Moçambicano celebrou a sua independência nacional total e completa, surgem desafios para todo moçambicano, o slogan, chamamento à Pátria. O país passou a ter imensas dificuldades pelos ataques de vizinhos , de governos minoritários, refere-se ao Rodésia do Sul(Zimbabwe) e o Apartheid da África do sul, que não só atacavam, como também criavam elementos internos, para se revoltarem contra o sistema então implantado. Isso tudo culminou com a criação do Serviço Militar Obrigatório.
Foi um privilégio participar no Exército sendo do grupo do primeiro recrutamento nacional.
Tendo assim, prestado o S.M.O escrupulosamente desempenhando funções de elite nas das forças populares de libertação de Moçambique, assim como era chamado o exército, não foi o mundo de rosas, amigos a perderem as vidas e alguns mutilados, estamos a falar o tempo da guerra dos 16 anos. A pressão era maior no seio das forças armadas, se bem que a logística tinha uma série de dificuldades em abastecer em víveres e produtos afins para os militares em todo o país. Foi um sacrifício tremendo, para todos aqueles que optaram abraçar o exército pelo chamamento, se bem que alguns camaradas fugiam das fileiras,sem deixarem rastos. É verdade!
Em 1982 quase no fim, se passa à disponibilidade e o regresso às funções anteriores, foi um grande alívio para a família, encontrar os pais, irmãos, amigos e até colegas de serviço. Um grande sonho realizado!...
( A infância é uma inocência!)
Quando se regressa da tropa se pretende que tudo se faça. Não foi fácil retornar a vida civil, porém, não precisava de procurar o emprego, se bem que, fora funcionário antes, na empresa caminhos de ferro. Fosse como fosse, tinha que começar de novo. O noivado rompido, companheira pensado que fosse morrer na guerra, arrumou o melhor o que pode.
O sector de recursos humanos achou melhor lhe enviar para Mutarara, a Estação de Dona Ana, para onde foi reconduzido, em plena guerra dos dezasseis anos, instala-se aqui. Depois de algum tempo ganha estatuto de sub-chefe. Casa-se aqui pela religião e pelos registos civil, com a sua inesquecível falecida, Nazaré da Costa Nobre.
É! era necessário arregaçar as mangas, para enfrentar nova vida, o profissionalismo e chefe da família no sentido muito vasto, teve que velar pelos seus pais e seus irmãos. O salário não correspondia positivamente, entretanto, fez tudo quanto pode para ajudar os seus próximos. Utilizou a zorra manual, veículo ferroviário sem motor, transportando batatas doce, da Localidade de Chavundira (Mutarara-velha) para Dona Ana. Por vezes. ia ao rio Chire, trazendo de lá peixe fresco. Essa actividade sem grandes rentabilidades, deu o que deu na altura, a ponto de ter criado uma pontinha de inveja nos irrefletidos, a vida sempre foi assim! Os homens não procuram muitas vezes medir os esforços dos outros, senão questionar os resultados de esforços destes.
" Eu dizia, de mim para mim, repetindo o dito do Doutor António Oliveira Salazar, "quem não tem inimigo não tem valor",embora com uma dose de politica, essa afirmação faz bem sentido em muitos casos concretos."
Pelo amor que tem por Mutarara, tem estado a dizer para muita gente, que senão fosse a guerra naquela altura, ainda estaria lá vivendo com a sua família. Talvez nem toda a desgraça cairia tão rápido na sua esposa,tem pensado assim! Por que tudo teve a ver com desgraça da guerra dos dezasseis anos. Isso é verdade! De Mutarara saiu-se apenas com as vidas nas mãos, como se fosse uma mercadoria perecível Porque um pequeno descuido era a morte certa. A vida durante a guerra foi um inferno que não dá recordar por muito tempo...
Porem, recordar é viver, enquanto vivos o passado vai-se transpirando, digamos, transbordando para a nova geração, essa geração que parimos. Trazendo-nos netinhos e a esses descuidadamente transferimos as nossas entranhas. Nunca se deve dizer, esqueço tudo, enquanto continuamos fecundos. Essa nova geração alegra aos mais velhos, aos avós.
A fecundidade é uma lógica de eternidade. Somos fecundos e eternos!
(Nhansoa)
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