quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

MAS VALEU A PENA!



 
 
                                                                                             
                                                                                                    
 
           EM 1956 nasceu um indivíduo, na zona sul da província de Tete, mais concretamente na área entre os rios Zambeze e Chire ( Inhangoma). Em plena era colonial, conheceu todas as amarguras da vida daquela época, a falta de roupa, alimentação adequada, assistência médica e medicamentosa, toda uma série de necessidades básicas para uma vida humana e digna. Para não deixar de salientar o fenómeno de segregação racial, que se vivia por todo o  país(Moçambique). Aos sete anos ingressou numa escola primária missionária.
          Na condição de indígena não assimilado, a única via, era apenas estudar nesse tipo de ensino. Foi uma vida difícil,tinha que percorrer  diariamente vinte e cinco quilómetros para escola. Na mesma sala de aulas compartilhavam duas classes e com o único professor.
         As actividades domésticas, essas não faltavam, pastar cabritos,caçar gazelas e animais de pequeno porte, pescas etc. Tudo isso, era tido como o quotidiano de um jovem normal e obediente  e granjeava prestígio no seio de populares.É o que interessava à juventude da época...
            Em 1968, após uma longa batalha de vaivém   consegue concluir o ensino primário, numa situação muito difícil. Se bem que todos os alunos missionários, eram obrigados a prestarem exames da quarta classe, numa escola oficial (do governo), com nota zero,conhecer bem a geografia , história de Portugal e o hino nacional de Portugal. Portanto,  o aluno tinha como obrigação, no ensino primário conhecer teoricamente Portugal e a história dos portugueses. Os exames sempre eram duros para os alunos das missões, especialmente nas provas orais.
           Com a quarta classe feita, julga-se meio caminho andado. Era necessário procurar Vilas da época, para um possível emprego. Foi assim que em 1970 descobre uma vila açucareira na província de Sofala (Marromeu). Valeu a pena conhecer este povo hospitaleiro, meigo e amável. Praticamente foram dois anos convivendo com esse povo, em plena época colonial.
            O desejo ardente era  uma possível progressão na esfera social (desafio de todo mundo), para tal , se chega na cidade da Beira em piores condições. Ora bem, isso acontece como havia dito em plena época colonial, as coisas não eram tão fáceis como se esperava de uma cidade como Beira, dominada economicamente pela classe de elite colonial. Opção inicial para sobreviver:( se transforma num serviçal, em quase dois anos neste tipo de actividade de sobrevivência, sujeitando à uma série de vicissitudes da época).
          Mas valeu a pena, e as portas iam-se abrindo. Primeiro pela intensificação da luta pela libertação de Moçambique, liderada obviamente pela FRELIMO. A consciência patriótica se apodera a toda gente oprimida, a esperança pelas mudanças e a independência nacional, era a conversa de cada esquina entre os oprimidos.
              Finalmente os acordos pela paz foram alcançados, e abriram-se os novos horizontes, alfabetização, educação de adultos e o conceito de produção e produtividade se vigora. O novo rumo dependia dos esforços de cada um dos moçambicanos.
              Finalmente, se consegue concluir o nível básico com sucessos, e pode-se ingressar numa grande empresa, então estatal, Caminhos de Ferro de Moçambique como funcionário de estado, estamos a referir os meados de 1977, durante dois anos de intensos trabalhos, em 1979 é transferido para da antiga TRANZ-ZAMBEZIA-RAILWAYS (TZR), linha de Sena, mais concretamente na Estação de Dona Ana em Mutarara, por sinal sua terra natal.
 
           Os imperativos da nação,em 1975, aos 25 de Junho o povo Moçambicano celebrou a sua independência nacional total e completa,  surgem desafios para todo moçambicano, o slogan, chamamento à Pátria.   O país passou a ter imensas dificuldades pelos ataques de vizinhos , de governos minoritários, refere-se ao Rodésia do Sul(Zimbabwe) e o Apartheid da África do sul, que não só atacavam, como também criavam elementos internos, para se revoltarem contra o sistema então implantado. Isso tudo culminou com a criação do Serviço Militar Obrigatório.
             Foi um privilégio  participar no Exército  sendo do grupo do primeiro recrutamento nacional.
            Tendo assim, prestado o S.M.O escrupulosamente  desempenhando funções de elite nas das forças populares de libertação de Moçambique, assim como era chamado o exército, não foi o mundo de rosas, amigos a perderem as vidas e alguns mutilados, estamos a falar o tempo da guerra dos 16 anos. A pressão era maior no seio das forças armadas, se bem que a logística tinha uma série de dificuldades em abastecer em víveres e produtos afins para os militares em todo o país. Foi um sacrifício tremendo, para todos aqueles que optaram abraçar o exército  pelo chamamento, se bem que alguns camaradas fugiam das fileiras,sem deixarem rastos. É verdade!
            Em 1982 quase no fim, se passa à disponibilidade e o regresso às funções anteriores, foi um grande alívio para a família,  encontrar os pais, irmãos, amigos e até colegas de serviço. Um grande sonho realizado!...
 
                                                                                  ( A infância é uma inocência!)
 
 
 
                Quando se regressa da tropa se pretende que tudo se faça. Não foi fácil retornar a vida civil, porém, não precisava de procurar o emprego, se bem que, fora funcionário antes, na empresa caminhos de ferro. Fosse como fosse, tinha que começar de novo. O noivado rompido, companheira  pensado que fosse morrer na guerra, arrumou o melhor o que pode.
                O sector de recursos humanos achou melhor lhe enviar para Mutarara,  a  Estação de Dona Ana, para onde  foi reconduzido, em plena guerra dos dezasseis anos, instala-se aqui. Depois de algum tempo ganha estatuto de sub-chefe. Casa-se aqui pela  religião e pelos  registos civil, com a sua inesquecível falecida, Nazaré da Costa Nobre.
                 É! era necessário arregaçar as mangas, para enfrentar nova vida, o profissionalismo e chefe da família   no sentido muito vasto, teve que velar pelos seus pais e seus irmãos. O salário não correspondia positivamente, entretanto, fez tudo quanto pode para ajudar os seus próximos. Utilizou a zorra manual, veículo ferroviário sem motor, transportando batatas doce, da Localidade de Chavundira (Mutarara-velha) para Dona Ana. Por vezes. ia ao rio Chire, trazendo de lá peixe fresco. Essa actividade sem grandes rentabilidades, deu o que deu na altura, a ponto de ter criado uma pontinha de inveja nos irrefletidos,  a vida sempre foi assim! Os homens não procuram muitas vezes medir os esforços dos outros, senão questionar os resultados de esforços destes.
                   " Eu dizia, de mim para mim, repetindo o dito do Doutor António Oliveira Salazar, "quem não tem inimigo não tem valor",embora com uma dose de politica, essa afirmação faz bem sentido em muitos casos concretos."
                    Pelo amor que tem por Mutarara, tem estado a dizer para muita gente, que senão fosse a guerra naquela altura,  ainda estaria lá vivendo com a sua família. Talvez nem toda a desgraça cairia tão rápido na sua esposa,tem pensado assim! Por que tudo teve a ver com desgraça da guerra dos dezasseis anos. Isso é verdade! De Mutarara saiu-se apenas com as  vidas nas mãos, como se fosse uma mercadoria perecível  Porque um pequeno descuido era a morte certa. A vida  durante a guerra foi um inferno que não dá    recordar  por muito tempo...


                  Porem, recordar é viver, enquanto vivos o  passado vai-se transpirando, digamos, transbordando para a nova geração, essa geração que parimos. Trazendo-nos netinhos e a esses descuidadamente transferimos as nossas entranhas. Nunca se deve dizer, esqueço tudo, enquanto continuamos fecundos. Essa nova geração alegra aos mais velhos, aos avós

                      A fecundidade é uma lógica de eternidade. Somos fecundos e eternos!
                                        (Nhansoa)

quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

GOGODANE

       Uma vasta zona ao sul do posto administrativo de Inhangoma em Mutarara, rica em agricultura, todos os anos fazia-se duas épocas da colheita, especialmente o milho.
       Gogodane, nome de um rio resultado de vários riachos que se juntaram quase próximo do rio Chire, surgindo um leito de quase cinco quilómetros de comprimento, drenando suas águas no Chire.
       Para além das suas margens proporcionarem ricas terras para agricultura, o rio Gogodane era rico em pescado, muitos jovens iam lá pescar de anzóis e os mais velhos praticavam pesca artesanal, construindo uma espécie de cercos nas margens, utilizando o caniço,eram profissionais, uma actividade que cobriam todas as necessidades domésticas.
       Esta zona conheceu pela primeira vez, uma escola primária missionaria católica em 1964, leccionando apenas pré-primária e primeira classe, para completar o ensino primário e quem pudesse, arriscava-se a percorrer vinte e cinco quilómetros para a Missão da Nossa Senhora do Carmo em Traquino, uma pequena vila, com lojas e a sede do posto administrativo de Inhangoma e o respectivo centro missionário.
       Para matar saudades,em 2011 no mês de Dezembro viajei até Gogadane, confesso que foi uma grande ilusão, encontrei meia dúzia de palhotas, hoje a região está quase desabitada, as actividades que mencionei atrás já não se faz sentir com as mesmas dimensões.
       As constantes cheias, muitas vezes originadas pela barragem hidroeléctrica de Cabora Bassa, como medida preventiva, o governo criou novas zonas de reassentamento, uma nova vida e outra forma de se viver. O que requer algumas infraestruturas, escolas, postos de saúde, estradas e um impulso na parte do governo para ressurgirem comerciantes formais bem estruturados.
       O rio Gogodane permanece nas mesmas dimensões e no mesmo lugar com variadíssimas qualidades de peixes, incluindo o famoso peixe pende, o que me cria nostalgia!

                                                        MISSÃO NOSSA SENHORA DO CARMO



               CARRO DO SR. PADRE EM INHANGOMA            
                           ( Images tiradas em 2011 em Dezembro)